Há quem ainda insista em enxergar o voluntariado como um remendo, um improviso para suprir falhas de gestão ou carências crônicas de organizações sociais e/ou políticas públicas. É como se o voluntário fosse chamado apenas quando o barco já está fazendo água, para tapar buracos com as próprias mãos. Essa visão reducionista não apenas desvaloriza o potencial transformador do voluntariado, como também perpetua a ideia de que ele é acessório, secundário, quase descartável.
O voluntariado estratégico, ao contrário, nasce de uma compreensão madura: ele não é substituto de responsabilidades institucionais, mas sim força complementar que amplia impacto, gera inovação e fortalece vínculos comunitários. Empresas que o tratam como "programa de ESG ou RSE simpático" perdem a chance de integrá-lo às suas cadeias de valor, às suas estratégias de sustentabilidade e até mesmo à sua reputação. Organizações sociais que o veem como mão de obra barata deixam escapar o que há de mais precioso: o conhecimento, a criatividade e a energia cidadã que cada voluntário carrega.
Transformar o voluntariado em estratégia significa incorporá-lo ao planejamento, com objetivos claros, métricas de impacto e alinhamento às causas centrais da instituição. Significa reconhecer que voluntários não são apenas braços, mas cabeças e corações capazes de propor soluções, redesenhar processos e criar pontes entre mundos que raramente se encontram. É nesse ponto que o voluntariado deixa de ser paliativo e se torna motor de mudança.
Exemplos não faltam: programas de voluntariado corporativo que conectam profissionais a escolas públicas, levando competências de gestão e tecnologia; iniciativas comunitárias que, ao invés de apenas distribuir cestas básicas, criam hortas coletivas e redes de economia solidária; projetos culturais que não se limitam a organizar eventos, mas formam públicos, estimulam talentos e fortalecem identidades locais. Em todos esses casos, o voluntariado não tapa buracos — ele abre caminhos.
O desafio, portanto, é abandonar a mentalidade do improviso. Quem insiste em ver o voluntariado como remendo revela, no fundo, sua própria falta de visão estratégica. É mais fácil chamar voluntários para apagar incêndios do que para construir estruturas sólidas. Mas é justamente na construção que o voluntariado mostra sua potência: ele mobiliza, engaja, educa e transforma.
Se quisermos um país mais justo e resiliente, precisamos de voluntariado que não seja convocado apenas em emergências, mas que esteja presente no desenho das soluções. Voluntariado estratégico é investimento em cidadania, em inovação social e em futuro. Quem ainda o trata como tapa-buraco está preso ao passado ruim.
O voluntariado não é novo e sempre foi muito reconhecido, precisamos trazê-lo de volta a este lugar, inclusive com uma legislação mais protetiva e adequada as suas funções, bem como protetiva para as organizações que deles se utilizam de forma adequada. Estamos no momento para começar esta mudança de corretivo para estratégico.
Rumo as 400 semanas da coluna Ser Voluntário. Uma alegria ter você como leitor!
Roberto Ravagnani