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A aprovação do Plano Regional de Água e Esgoto e o avanço rumo à concessão dos serviços em 45 municípios, atendendo 1,3 milhão de habitantes, é um passo de grande impacto que exige ambição com prudência. Os mais de R$ 5 bilhões previstos em 35 anos buscam enfrentar déficits históricos de cobertura, qualidade e eficiência.
A regionalização e a transferência de competências ao Estado, com atuação de entidade reguladora, ampliam a responsabilidade: nenhum arranjo institucional pode servir de álibi para falhas que atingem o usuário e a sustentabilidade do sistema.
O desenho do certame, combinando outorga fixa e desconto tarifário, tenta atrair concorrência sem induzir lances temerários. É um caminho promissor, desde que acompanhado de regras claras para reequilíbrio econômico-financeiro, metas exequíveis e penalidades proporcionais. Sem isso, a competição pode virar judicialização amanhã. Realizar o leilão na B3 agrega transparência, mas não substitui um edital tecnicamente sólido, com critérios objetivos de habilitação, indicadores auditáveis e fiscalização independente.
A consulta pública trouxe alertas que pedem respostas contratuais, não protocolares. Trabalhadores do setor reivindicam salvaguardas na transição: realocações, quadros em extinção, programas de desligamento voluntário, proteção a quem se aproxima da aposentadoria. Ignorar essas pautas é arriscar litígios, perda de memória técnica e descontinuidade. Há soluções testadas: cláusulas sociais, cronogramas pactuados, fundos de apoio, planos de capacitação. Dar previsibilidade ao corpo funcional é parte da previsibilidade regulatória.
Do lado do usuário, o temor de tarifas abruptas precisa ser tratado com instrumentos de modulação. As tarifas devem refletir investimentos e custos, mas com mecanismos como tarifa social ampliada, estrutura escalonada por consumo e gatilhos de desempenho: remuneração cheia só a quem entregar universalização, qualidade da água, redução de perdas e esgoto tratado conforme metas verificáveis. Transparência de indicadores e painéis comparativos entre municípios são ferramentas de controle social, não mera formalidade.
A regionalização pode corrigir assimetrias, diluir riscos e ampliar escala. Mas pode sufocar especificidades locais sem governança interfederativa efetiva. O contrato de gerenciamento deve delimitar competências, prazos e instâncias de resolução de conflitos, com representação municipal real em decisões sensíveis. Sem isso, o arranjo fica opaco e vulnerável à captura.
O horizonte de 35 anos pede visão intergeracional. Mudanças climáticas e pressão sobre mananciais exigem resiliência: diversificação de fontes, proteção de bacias, reuso, redução de perdas reais e aparentes. Investir bem é reduzir custo futuro, não só inaugurar obra vistosa. Parte da remuneração deve estar condicionada a metas progressivas de perdas e qualidade de efluentes, alinhando incentivos ao interesse público. A pressa não pode atropelar a cautela. Editais robustos, audiências responsivas, matriz de riscos equilibrada e regulação independente são a melhor defesa contra tarifas insustentáveis e serviços precários.
Diário da Amazônia